Restauração Poupatempo Lapa, São Paulo
07-dez-2011Com proposta do arquiteto Pedro Taddei, nova agência do Poupatempo, em São Paulo, conta com duas fachadas – a antiga, de tijolo aparente, e a moderna, de vidro laminado -, e recupera o galpão histórico em antiga área industrial na zona oeste da capital.
Erguidos no século 18, os galpões de tijolo aparente localizados na Lapa, zona oeste paulistana, já registraram o apogeu da economia cafeeira, a passagem da estrada de ferro São Paulo Railway, que cruzava a capital ligando Jundiaí ao porto de Santos, e abrigaram atividades de beneficiamento de couro.
Depois veio a degradação, com a desativação das atividades industriais na região, na década de 1970. Mas a edificação inicia agora uma nova etapa de vida ao ser adaptada para receber a agência do Poupatempo Lapa.
Segundo previsões, essa unidade do programa que centraliza num local diversos tipos de serviços públicos deverá atender 10 mil pessoas por dia. A localização é adequada para essa finalidade: na confluência das ruas do Curtume e Guaicurus, vizinha à linha de trem hoje a serviço da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM).
Conciliar a preservação da identidade histórica dos antigos galpões com a nova proposta, que exige funcionalidade extrema, e ao mesmo tempo estabelecer um diálogo entre essas arquiteturas foram condicionantes do programa.
Além de espaços flexíveis com o máximo de vãos livres e montagem mecânica, possibilitando o remanejamento dos setores conforme a demanda dos serviços, o programa prevê uma futura expansão das instalações para duplicar a capacidade de atendimento.
Desenvolvido pelo escritório Arquiteto Pedro Taddei e Associados, o projeto arquitetônico está sob responsabilidade da Fundação para a Pesquisa em Arquitetura e Ambiente (Fupam), que responde também por outras oito novas unidades do Poupatempo.
OS GALPÕES
Originalmente, o imóvel possuía galpões com volumes distintos, tipologia e cronologia construtivas diferentes, ocupando quase que integralmente o terreno de 4 mil metros quadrados, em formato trapezoidal.
Após a reestruturação, o conjunto tornou-se único internamente, totalizando área construída de 3.959 metros quadrados, distribuída entre térreo e mezanino. As duas naves menores, próximas da linha férrea, na fachada voltada para a rua do Curtume, foram tratadas como uma réplica da estrutura original, mantendo sua orientação trapezoidal e cobertura de duas águas.
Destruído parcialmente pela ação do tempo, o conjunto apresentava problemas estruturais, infiltrações de águas pluviais e capilaridade do solo, trincas nas paredes e no piso, resultantes dos esforços causados pela passagem dos trens. Nas fachadas havia o descolamento do reboco, desgaste das argamassas e caixilharia em má conservação.
Devido a esse estado, foram preservadas as fachadas de maior porte e passíveis de recuperação. Para atender à solicitação de um espaço único de grandes dimensões, optou-se pela demolição dos telhados degradados e das paredes internas. Com isso, surgiu uma nova edificação.
Revestidas de argamassa, as paredes externas receberam detalhes de frisos, peitoris, sobrevergas, molduras e colunas em alvenaria aparente. No trecho das naves menores as esquadrias são de madeira com folhas fixas e basculantes. O piso interno foi elevado em cerca de um metro, pois o prédio está em área com risco de alagamento. Para reduzir a saturação de umidade no solo, evitando-se a sua ascensão por capilaridade, implantou-se um sistema de drenagem ao longo das paredes do perímetro.
Com pé-direito de sete metros, a nova instalação ganhou uma cobertura espacial vedada com telhas metálicas termoacústicas. Para as fachadas, a solução foi manter a alvenaria externa e construir uma fachada interna, envidraçada. Entre elas há um vão de três metros ocupado por jardins, protegidos por uma cobertura de vidro que circunda quase toda a edificação.
Com isso foi possível privilegiar a iluminação e a ventilação naturais, reduzindo o consumo de energia com ar condicionado, sem aumentar a carga térmica. O mesmo objetivo foi reforçado com a substituição das esquadrias arredondadas, nos vãos da fachada principal, por grades metálicas, explica Pedro Taddei.
De acordo com o arquiteto, o uso do vidro nos fechamentos verticais e horizontais se deve à necessidade de isolamento termoacústico da área de atendimento ao público (que é climatizada) e de transparência, garantindo a visibilidade dos jardins e das fachadas originais.
É a partir da face interna de vidro que começa a nova edificação. Tal solução sugeriu a liberação das fachadas históricas com relação ao novo edifício e resultou em um espaço unificado, que ressalta o contraste entre as linguagens arquitetônicas.
Taddei explica que buscou um diálogo através da luz e dos elementos que utilizou nos acabamentos para criar um ambiente agradável e tranquilizante. A iluminação natural periférica através dos jardins longitudinais é refletida pela face interna das alvenarias das fachadas históricas, revestidas com argamassa. A areia colocada nos jardins, em meio à vegetação, também reflete a luz, que neste projeto foi primordial.
O ANTIGO E O NOVO
Devido ao seu significado histórico, as fachadas externas foram restauradas e preservadas suas características originais. Primeiramente foi feito o projeto de contensão e estruturação das mesmas, depois foram retirados telas de proteção, fiação, instalações elétricas, ganchos, placas e elementos metálicos.
Para a contensão utilizou‑se uma estrutura mista de concreto e aço. A estabilidade do plano da parede se deu através dos pilares de concreto, embutidos na alvenaria revestida de argamassa, combinados com pilares e vigas metálicas constituídas de tubos de cem milímetros. Devido aos esforços da ação dos ventos, a estrutura de reforço tem também um contraventamento de cabos de aço tensionados aparentes.
Com cerca de 97 metros de extensão e pé-direito de 6,30 metros, o pano envidraçado é fixado a estrutura metálica aparente em pórtico composta por treliça espacial com pilares tubulares de apoio em acabamento de pintura epóxi na cor branca e cabos de aço para o contraventamento. A estrutura da fachada trabalha de forma independente da estrutura espacial destinada à cobertura do salão.
Para dar maior transparência ao edifício, a face envidraçada foi construída com o sistema de vidro estrutural. Laminados de 16 milímetros e medindo até 3 x 2,07 metros (peso médio de 200 quilos) foram fixados nos pilares tubulares do pórtico por meio de ferragens especiais articuladas de aço inox.
Responsáveis pela execução e fabricação das fachadas e coberturas de vidro, as empresas Esquadriall JRC e Conlumi levaram seis meses para finalizar os trabalhos. De acordo com Marcus Alexandre Zanarolli, diretor geral da Esquadriall JRC, para a colocação dos vidros foram necessários guindastes e caminhão munck com braço hidráulico articulável e guinchos próprios.
As portas de acesso ao edifício, instaladas nas fachadas envidraçadas, são de vidro temperado de dez milímetros, com barras antipânico aplicadas diretamente nos vidros. Segundo Zanarolli, o procedimento é incomum, visto que a maioria das empresas coloca as barras somente em portas de alumínio. O sistema de abertura das portas é através de molas de piso hidráulicas e pivô superior.
COBERTURA DE VIDRO
A cobertura do edifício se define em três partes: a principal, formada pela estrutura espacial e telhas metálicas termoacústicas; a das naves laterais, que utiliza telhas metálicas; e a cobertura de vidro inserida em dois trecho (o primeiro, entre a área de atendimento ao público e a nave lateral junto à linha férrea; o segundo, entre as fachadas de alvenaria e vidro).
No primeiro trecho, onde estão instalados os serviços internos do órgão, a área envidraçada é menor. A modulação é de 1,80 x 3,40 metros e se estende por 37 metros. A intensidade de luz está sob o controle do sistema automatizado de cortinas horizontais do tipo rolô. Nesse trecho a iluminação é complementada pelos fechamentos dos oitões da fachada com laminados temperados de 16 milímetros, que junto com os vidros da cobertura formam um L invertido.
O segundo trecho, inserido entre as fachadas históricas e a de vidro, circunda quase todo o perímetro trapezoidal da área de atendimento ao público e protege os jardins. Com largura de 3,70 metros e extensão de 97 metros, a área total de 455 metros quadrados recebeu placas de vidro cristal temperado laminado, com espessura de 18 milímetros, coladas com silicone structural glazing em perfis de alumínio.
Os quadros foram fixados sobre apoios metálicos do pórtico. Na interface da estrutura da fachada e da cobertura foram utilizados espaçadores de espuma (Inducel) com um centímetro de espessura.
De acordo com Zanarolli, “na cobertura foram utilizados cabos de aço para selar as instalações e impedir o envergamento dos vidros. O distanciamento entre os cabos e a utilização de outros elementos de apoio, como as colunas de alumínio, impedem o selamento do dorso do vidro e, ao mesmo tempo, conferem leveza ao visual sem prejudicar a sustentação”.
No restante da cobertura estão inseridos, aleatoriamente, dispositivos de iluminação natural controlada, que captam, transmitem e difundem a luz no interior do ambiente. Além disso, a iluminação artificial projetada utiliza lâmpadas de baixo consumo e maior eficiência energética.